Terceirização: Comentários ao PL 4.330/2004.

O Projeto de Lei 4.330/2004 tem provocado grande debate em todas as camadas da sociedade, demandando de todos opinião crítica a respeito da terceirização. Muitos são os discursos inflamados, motivados pela indignação, de um lado, e pelo apoio irrestrito, de outro; mas também pelo desconhecimento dos termos do projeto e da realidade havida na prática atual da terceirização.

Nesse sentido, o presente se presta a comentários iniciais, tomando por base o atual cenário legal e jurisprudencial da terceirização, bem como o texto substitutivo do Projeto de Lei, após votação e aprovação na Câmara dos Deputados, sem prejuízo de debates posteriores e comentários adicionais que se mostrarem necessários.

Em sede de contextualização, preliminarmente, há que se consignar que a terceirização, no sistema legal vigente, não é regulamentada por lei, mas orientada pela jurisprudência, notadamente pela Súmula 331, do Colendo Tribunal Superior do Trabalho.

Assim, o pretexto legislativo de ausência de parâmetros para o assunto é falho, uma vez que, na atual sistemática jurídica, não são raras as vezes que os Tribunais expedem orientações a fim de vencer lacunas legais; e, afinal, é essa a função que incumbe ao Judiciário.

Sem divagações inoportunas, passemos à análise da referida Súmula 331, que estabelece critérios mínimos para não se caracterizar como ilícita a terceirização. É interessante notar que os enunciados jurisprudenciais diferem dos enunciados legais, na medida em que se compõem de descritivos negativos ao invés de conceitos positivos. Assim, da leitura da Súmula 331, observa-se que o Tribunal ocupou-se de esclarecer o que não é terceirização lícita e os consectários legais da irregularidade.

Tem-se que o Tribunal Superior do Trabalho admite a terceirização dos serviços de vigilância, de conservação e limpeza; e de qualquer outro que não seja atividade-fim da tomadora, “desde que inexistente a pessoalidade e a subordinação” (Súmula 331, do TST).

Em termos práticos, toda atividade que não compuser a atividade preponderante da empresa contratante poderá ser terceirizada.

Enquadrada como atividade-meio, ainda é necessário que não tenha havido subordinação ou pessoalidade do empregado com a tomadora de serviços, o que, se verificado, enseja o estabelecimento do vínculo empregatício do empregado diretamente com a empresa contratante, com a consequente responsabilização solidária desta.

Aliás, é importante esclarecer que, na atual sistemática, se lícita a terceirização, haverá responsabilidade subsidiária da empresa tomadora de serviços. Apenas na hipótese de terceirização ilícita, a responsabilidade será solidária.

O ponto mais polêmico do PL 4.330/04 é a abertura irrestrita para que toda e qualquer atividade possa ser terceirizada: “É lícito o contrato de terceirização relacionado a qualquer parcela de qualquer atividade da contratante” (art. 4º).

Subsiste, porém, a ressalva de que “configurados os elementos da relação de emprego entre a contratante e o empregado da contratada, a contratante ficará sujeita a todas as obrigações dela decorrentes, inclusive trabalhistas, tributárias e previdenciárias” (art. 4º, § 1º).

Sobre a responsabilidade, estabelece o PL 4.330/04, que será subsidiária, na hipótese de comprovada fiscalização da empresa contratada pela empresa contratante; e solidária, na hipótese de não comprovação da fiscalização (art. 15).

Na prática atual, temos que a comprovação da fiscalização por parte da tomadora se mostra quase intangível, principalmente pela falta de parâmetros objetivos mínimos de como se deve dar a fiscalização.

Nesse sentido, o art. 16, da PL 4.330/04, solidifica critérios já há muito trabalhados na jurisprudência, para aferição da culpa do tomador na fiscalização da empresa contratada, elucidando que se entenderá por fiscalização “a exigência mensal, pela contratante, da comprovação do cumprimento das seguintes obrigações trabalhistas e previdenciárias, em relação aos empregados da contratada que efetivamente participarem da execução dos serviços terceirizados, durante o período e nos limites da execução dos serviços contratados: I – pagamento de salários, adicionais, horas extras, repouso semanal remunerado e décimo terceiro salário; II – concessão de férias remuneradas e pagamento do respectivo adicional; III – concessão do vale-transporte, quando for devido; IV – depósitos do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS); V – pagamento de obrigações trabalhistas e previdenciárias dos empregados dispensados até a data de extinção do contrato de terceirização; VI – recolhimentos de obrigações previdenciárias”.

Havendo inadimplemento de qualquer das verbas, nos termos do PL 4.330/04, a empresa contratante poderá reter do faturamento da empresa contratada o montante equivalente e efetuar diretamente ao empregado o pagamento, sem que isso gere vínculo empregatício.

Em sede de conclusão, afirma-se que a extensão da terceirização para a atividade-fim da empresa indiscutivelmente significa perda de direitos trabalhistas e, consequentemente, economia para as empresas contratantes, e esse é o ponto mais sensível do PL 4.330/04.

No entanto, de uma análise mais ampla, extrai-se a proposta de proporcionar um cenário mais seguro para os empregados que já estão sujeitos à terceirização, uma vez que se estabelece a garantia do adimplemento das verbas trabalhistas ao longo da prestação de serviços e critérios para fiscalização da empresa contratada. E mais, inclui-se no rol de benefícios dos terceirizados, a possibilidade de desfrutar da mesma alimentação, transporte e atendimento médico dos empregados da tomadora de serviços. Tudo isso, sem revogar a possibilidade de configuração do vínculo empregatício sempre que presentes os elementos legais para tanto e a possibilidade de responsabilização solidária da tomadora de serviços no caso de negligenciamento da fiscalização do cumprimento das obrigações trabalhistas e previdenciárias pela empresa contratada.

(Fernanda Lemos, OAB/P 345.766, pós-graduanda em Direito e Processo Tributário)

Terceirização: Comentários ao PL 4.330/2004.

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